Arte: Sarolta Bán |
Somos uma sobra dum quadro pintado que caminha por um deserto habitado e desabitado. Somos várias pessoas-sombra que caminham sem tomarem conhecimento umas das outras. Em cada pintura egoísta só aparece um. Queixam-se da solidão e não se enxergam mutuamente. Caminham tão sem vida que nem sequer deixam rastros na areia. Caminham sós, lado a lado, mas sem companhia, rumo a um nada ou a um algo que desconhecem. O rumo traçado é falso e incerto e o que têm de concreto, ao alcance das mãos, é menosprezado. A pomba da paz tenta alertar para os atritos resultantes da solidão coletiva, do egoísmo e do egocentrismo, desse caminhar solitário em companhias aparentemente invisíveis, não vistas, mas nem é ouvida e apenas voa seu voo habitual e cata as migalhas deixadas pelo caminho pelos caminhantes por pura displicência consigo mesmos. A paleta de tinta e os pincéis foram deixados, abandonados, e tudo parece se resumir a um céu nublado, uma pessoa só e uma pomba à toa. E o pintor, por que nos abandonou? Ou fomos nós os pintores esquecidos que deixamos nossas paletas e pincéis para trás? Acho que sim, mas via de regra tendemos a culpar Outrem. É sempre mais cômodo um dedo além do que reconhecer-se responsável ou, no mínimo, corresponsável.