quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Mercado Marcado

Vivemos em uma sociedade em que as licitações públicas, via de regra, não passam de um "jogo de cena" medianamente bem armado. O que ocorre é que as pessoas, incluindo nós, financiadores de todas as obras públicas (e algumas privadas, por meio de desvios de verba que ocorrem), não somos suficientemente bem informados a respeito de como ocorrem as licitações públicas. São raras, quase inexistentes mesmo, as licitações públicas onde o vencedor oferece o melhor trabalho pelo melhor preço. Normalmente o vencedor da licitação é um "carta marcada" que fornece a maior propina à pessoa ou grupo mais influente.
Em teoria uma licitação coloca em jogo a busca de uma empresa ou prestadora de serviço tecnicamente qualificada para buscar o melhor preço para a execução de um determinado trabalho. Na prática a qualidade vai para menos e o preço vai para mais. O valor real da obra é uma parcela do total, sendo o restante dividido entre os criminosos travestidos de autoridades e pessoas sérias. Do presidente da república aos assessores de vereadores dos menores municípios do país e passando pelas empreiteiras, o roubo por meio de licitações públicas "legais" é hábito corriqueiro, sabido por muitos, inclusive pela imprensa, mas mantido "em off" na maior parte do tempo.
Quando algum escândalo surge a respeito de alguma obra pública, é noticiado em tom de suposto horror, como se não se soubesse que é assim na esmagadora maioria dos serviços públicos, especialmente os de maior monta. Quanto maior o valor envolvido, maior a probabilidade ou certeza de que os processos envolvidos são cuidadosamente fraudulentos e beneficiam políticos, apadrinhados, financiadores de campanhas etc.
Alguma vez se viu uma investigação sobre enriquecimento ilícito de algum governante, parlamentar ou de alguém do judiciário ser levado a cabo até as conseqüências finais? Tomemos por exemplo o caso de famoso político paulista (PSM são suas iniciais). Há provas e mais provas, e o homem continua a ser votado, continua impune e continua negando até o inegável: que assinaturas dele de contas bilionárias no exterior são dele.
Vamos agora a algo também "normal" em nosso meio. Tenho plano de saúde Unimed e em 2002 tive que me submeter a uma cirurgia para a retirada da vesícula biliar. Meu plano não cobre quartos, então logo ao chegar ao hospital, enquanto assinava os papéis de entrada, me informei quanto eu teria que pagar para, ao invés de ficar na enfermaria (que é o que o meu plano cobre), ficar num quarto. O funcionário administrativo do hospital foi verificar e voltou me dizendo que o valor era de R$ 98,00/dia e assinei um termo de aceite. Muito bem, feito isto, fui para o quarto. Quando já estava pronto para ser conduzido para o centro cirúrgico, entra uma enfermeira, a mando do cirurgião (pessoa conceituada e "séria") com um papel na mão onde se declarava que o valor que eu deveria pagar a mais era outro. De R$ 98,00 passou para R$ 1.110,00. A alegação era se minha opção era ir para o quarto, também pagaria complemento a toda a equipe. Por que? Eles cuidam do quarto? A cirurgia seria diferente? Não! É apenas a malandragem de se aproveitar de uma situação "favorável" a eles. Cobram mais porque eu quero ficar no quarto, e só. O hospital dá cobertura, claro, embora já tivesse me passado o valor inicial bem diferente. Naquela situação e naquele momento NINGUÉM está apto a questionar, já que era uma cirurgia de emergência. Fui extorquido por uma equipe médica "séria" e ao tentar questionar não fui levado a sério. Agem como coisa corriqueira (e é mesmo!) e mal te olham no rosto. Ao interrogar na Unimed, depois da cirurgia, me disseram que o procedimento era ilegal e que se eu quisesse poderia fazer denúncia. Ao consultar advogados a instrução foi de "deixar quieto", pois eu teria muita dor de cabeça e provavelmente nenhum resultado. Era palavra contra palavra. Recibo? Não deram nenhum desse "extra", nem insistindo por semanas.
Ainda no hospital uma prima que foi me visitar, também médica, vendo minha indignação em relação ao ocorrido me disse que "o valor era cobrado porque quando se está num quarto você tem mais atenção do médico". De bate-pronto perguntei: "Tenho mais atenção ou tenho a atenção que TODO E QUALQUER CLIENTE DEVE TER, independentemente do tipo de plano e do quanto está pagando? Ela deu um risinho misto de sem graça e de quem pensa "Tadinho, olha o que ele está contestando!" e nada respondeu.
Estas máfias camufladas atuam em nosso país e não temos muito o que fazer com elas. Podemos protestar, mas ações individuais surtiriam pouquíssimo efeito (ou nenhum). O necessário seria uma ação coletiva. Seria necessário não de chamar de honesto um médico que compactua com este tipo de prática. Seria chamar de desonestos nossos administradores, nossos políticos, nossos magistrados etc. Todos? Não, mas a aterradora maioria, infelizmente.
Resta uma pergunta: que respaldo teríamos? Quem nos julgaria não seria também pertencente a uma dessas máfias legalizadas? Eu corro o risco apenas pela publicação desta matéria, embora haja o direito de livre expressão. Pelo menos tomei o cuidado de não citar nomes. Façam o mesmo. Cuidado, a máfia mata!

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