quarta-feira, 7 de abril de 2010

Contemplação

Aquela figura frágil que foi forte, que foi pai e mãe, que foi instrução, construção e desconstrução, prumo e desaprumo. Vejo aquela figura perdendo os traços de fortaleza e sucumbindo ao tempo, aos maus tratos do tempo, dos eventos da vida, de pessoas insensíveis que sempre encararam suas fragilidades (mistas com força tremenda) como pura e mera "frescura". As pessoas são extremamente cruéis quando se trata de apontar o dedo na direção dos outros. Ouço seu choro desesperado todos os dias, em quase todos os cantos, e sei que a despedida final não deve tardar muito. Se seguir os passos dos antepassados, pode até ter mais 10 ou 15 anos, sabe-se lá, e chegar perto dos 100 ou até lá. Mas o sofrimento já é, em muitas formas, deixar de viver, morrer um pouco. Ouço seu choro, ouço impotente, mas atingido, fragilizado, meio igual, meio diferente, meio reprodução, meio criação, meio velho, meio novo. Ouço a voz do ventre, ouço o sussurro da morte e a tragédia estampada numa vida de pessoa forte, vista como fraca, tantas vezes criticada e ridicularizada, até. Incompreendida, sempre! Vejo dedos e mais dedos apontados e pessoas que a cumprimentam como um resto qualquer, como uma sombra que só merece algum respingo de respeito fingido por educação a mim. Não, não peço por mim. Aliás, normalmente não peço, me calo, apenas assisto. Não tenho o poder de educar as pessoas e abrir-lhes os olhos. Tais pessoas, incapazes de enxergar uma pessoa idosa, fragilizada e que não é o requerido símbolo de positividade (pois foi-lhe impossível ser assim) é um ser humano, demasiadamente humano, como aquele que aponta o dedo sem ver os dedos que tem apontados sobre si. Dói-me ver tudo isto, dói-me sentir a impotência quase que total, dói-me não poder ser mais e ver suas preces serem desprezadas, simplesmente lançadas ao vento, sem que nenhuma sequer, nem a mais ínfima, seja atendida. Dói olhar a vida, em seu epílogo, frente a frente... Mas sempre olhei, não por escolha, mas porque ela sempre saltou diante de mim, inescrupulosamente, acintosamente, abusadamente. O choro ecoa pelas paredes, cantos e anos e não terminará de ecoar e se fazer ouvir nem com o fim inevitável, pois já entranhou minh'alma. Ela, que chora, não é frágil, só é humana. É admirável, esta mulher! A vida é que não foi admirável para ela...

2 comentários:

  1. Ivan, e esta tua dor, ao ler, nos dói!!!

    Às vezes, só assistir bastaria, mas é impossível ler este desabafo e não desejar te dar um abraço.

    Um beijo carinhoso,

    Carmen Silvia Presotto
    www.vidraguas.com.br

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  2. Li muda seu desabafo e reli muitas vezes com os olhos cheios cada letra tão sentida e tvz por isso mesmo tão cheias de significados...
    Não me senti apta a comentar e para falar a verdade ainda não me sinto...vim aqui só para mostrar a minha também impotencia diante da dor e do inevitavel...vim ler tudo denovo e dizer que lindo são seus olhos por enchergar tão bem de tão perto que é mais dificil do que longe nesses casos!
    Ahhhh Ivan.. so me resta correr para fila do abraço....

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