quinta-feira, 27 de maio de 2010

Água

Dá-me água, dá-me água
Que sem água não vivo
Que sem água não sou
Uma jarra cheia de águas diversas

Jorrando propriedades
Águas de cheiros bons
Águas de amores feitos
Águas de ablução que lava a alma

Água da saliva do beijo
Água do brejo fresco
Amor que hidrata a pele
Beber que acalenta o toque a dois

Água que vem de cima
Chuva que traz a vida
Água que vai embora
Volta pro rio, que volta pro mar que foi

Se água já a tenho aqui
Traz-me, pois, o vinho
As postas de peixe
Os frutos do amar, da água e do mar

terça-feira, 25 de maio de 2010

Quente, frio...

Às vezes me parece que o aquecimento global é resultado do resfriamento das relações humanas, especialmente nas áreas onde há superpopulação e é maior a corrida, que passa a ser só por lucros. As pessoas se esbarram, mas não se tocam. É frio este aquecimento.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Sem dono

A vida, afinal, de quem é, se nunca é nossa e sempre se vai? Pra onde, quando, por que?

Obs.:
Aforismo surgido de um comentário feito após a leitura de uma bela postagem do site Teatro da Vida, de Lara Amaral, em 23/05. - Link: http://laramaral-teatrodavida.blogspot.com/

Foste

E que o mar em suas ondas carregue o teu espírito em paz, sereno...
Lugar desconhecido, almejado, quiçá desejado... Será?
Zumbidos dizem sim, outros dizem não
Antes seria dia de aqui chegares, mas agora te foste já há dois anos.

Foste, mas ficaste nos corações, daí és sempre eterna.

sábado, 22 de maio de 2010

Bravo!

Justamente aquelas mãos mágicas!
Ostentava tantas notas rápidas e talentosas
Atentado, assalto, afronta.
Outras formas iria encontrar a tocar.

Contínuo e audaz fez-se novo,
Avançou contra todos os prognósticos dados,
Resolveu-se inteiro em parte.
Lastimou sem entregar-se, tocou o mundo.
Ovacionado, seguiu notado:
Sol, lá, si, ré, dó... tocou ainda mais, com dó, sem pena.

Metamorfose da superação,
Atentado da vida fez-se ver, mutilação da arte.
Restrito em movimentos, tocou,
Tateou o piano como possível, encheu-lhe de notas,
Invejou-se do impossível, fez-se único - o é! -
Navegou assim enquanto pôde, e mais metamorfose:
Suado, digno, agora rege e reage, sempre.

PS:
Salve João Carlos Martins, um dos maiores pianistas que o Brasil e o mundo conheceram, agora regente, impossibilitado de tocar piano por uma série de fatos que lhe tiraram os movimentos (primeiro da mão direita, depois da esquerda) e não mais o permitiram alcançar suas fabulosas 21 notas por segundo. Agora rege as notas todas, maestro, regente, extrapolou o piano, e emociona os bons ouvidos e almas com sua história peculiar, emocionante, de resolução e, claro, levando sua boa música onde puder. Há tempos queria escrever algo em homenagem ao João Carlos Martins, mas acho que por mais que o faça, nunca estará à altura da grandeza deste artista impar. Quis a vida fazer-lhe render-se e ele engrandeceu a música.

Confronto

Sentado, caneta nas mãos
Dedos a sustentá-la
Idéias rotas
Eu roto

Sentado, papel branco à frente
Querendo saber de gente
Nada lhe informei
Maquiavélico

Sentado, contendo idéias
Retidas em cabeça oca
A vida me inquiriu
Não respondi

Sentado, inquiri a vida igual
Impávida, andou adiante
Soltou lá seu olhar
Distante, calada

Sentado, peguei o papel cá
Enchi-lhe de notas
Coisas rotas
Vida rota

De pé a vida inquiriu-me de lá
Avançou com força
Viu-se aqui posta
Sucumbiu
Obs.:
Foto retratando o movimento de uma dos atos do Ballet Triadico, de Oscar Schlemmer, tirada em 28/11/2008 no Centro Universitário Senac - Campus Santo Amaro, em São Paulo/SP. As vestimentas/figurinos usadas neste ballet tem como objetivo limitar os movimentos dos dançarinos (ao contrário do que se busca na dança, de forma geral), tendo como resultado algo extremamente interessante, original e inovador, além de desafiador para os dançarinos. Achei que ilustraria bem o poema.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

A travessa

As travessas cruzam a grande via principal
Pela qual caminho lá
Procuro as travessas que atravessam
As mais interessantes
Um lugar a sentar-me, tomar um chope
Pessoas atravessam
A via principal borbulha de gente e arte
Meu olhar borbulha
Aquela moça que dança me põe notas
Meu ouvir se encanta
Aquela moça que canta me faz dançar
Degusto meu chope gelado
Atravesso os pensamentos da via principal
A vida atravessa as vias todas
A travessa segue sendo a principal via
A travessa... atravessa
Obs.:
O lugar da foto fica na Rua Carlos Comenale, 97 - travessa da Av. Paulista, atrás do MASP: Choperia Opção, recomendadíssima. Tenho até carteirinha de lá. No dia havia arte, mais ainda, por todo lado por conta da virada cultural ocorrida no final de semana.

Saguão

Saguão de embarque do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo/SP. Longa espera, não por atraso do vôo, mas por adiantamento meu. Pessoas tensas, pessoas apressadas, outras poucas tranquilas, até adiantadas, todas num vai e vem ininterrupto. Uma bela loira fica andando ao redor de uma pick-up, lançamento de luxo de uma grande montadora de automóveis. Linda, quase ofusca o carro. Deve ser um trabalho chato, manter um sorriso quase ininterrupto no rosto, sorriso obrigatório à função, dando informações repetidas para chatos e não chatos encantados com a máquina. Qual das máquinas? Às vezes as duas, já que 99% dos admiradores são homens e, claro, param para pedir informações, o que é chance de contato, mas não de tato. Nas cantadas, às vezes, ou via de regra, falta exatamente isto: tato. O fluxo de passageiros aumenta e diminui. A voz sexy (ou pretensamente sexy) dos auto-falantes se faz ouvir com certa frequência. Quantas vidas, quantas histórias. Saguão de aeroporto é um desses lugares onde, no meio da multidão, se está só. Ao meu lado um homem ao celular dá instruções de negócios, coisa grande, talvez, média, ao menos. A moça à minha direita, sutilmente curiosa, me observa a escrever com boa letra em papel A4 reciclado e com uma caneta preta normal e pouco usada, semi-nova. Nem sabe que foi citada, nem sabe quem sou eu, nem eu sei quem é ela. Muitos se observam, pouquíssimos se falam. Os motoristas de taxi são, a meu ver, um dos pontos altos da megalópole: eficientes, bem informados e educados. Não é assim em toda cidade grande. No Rio, por exemplo, é bem diferente. Em São Paulo, sempre rendem uma boa conversa. O que me trouxe aqui contou sua vida desde o casamento até aquele instante e me deixou seu cartão dizendo que me buscaria em Congonhas na minha próxima estada com o maior prazer. A loira, ao redor do carro em amostra, continua lá, linda e alta, com seu sorriso obrigatório. Ela tem pneuzinhos, notei! Isto a faz mais humana e até mais interessante. O diminutivo ajuda, mas ela é bem alta. Em meio a isto, me pergunto: o quanto há de obrigatório e o quanto há de escolha em toda esta gente que circula freneticamente? Onde se delimita a divisão entre a tortura, o mecânico e o prazer? É tudo, quase tudo, frenético. Vive-se para trabalhar, quando deveria ser a ordem inversa. Um saguão retrata o humano mecanizado, até desumanizado. A razão irracional, os sentimentos contidos nos papéis desempenhados na vida. Negócios, negócios e mais negócios. Estresse, estresse e mais estresse. Ambições variadas, mas normalmente pouco dosadas. Vão pegar vôos de destino ou estão a voltar para casa? Para alguns, as poucas horas de vôo com o celular desligado são uma tortura imensurável. Não sabem mais viver sem o celular, sem a agenda, sem o notebook, sem o mp3. A pessoa ao lado já não existe mais, nem nos bancos apertados dos aviões. Apertadíssimos, aliás. Felizes dos baixinhos e magrelos. Estou a passeio, voltando pra casa, pra terra natal, pro trabalho de que gosto, e que seja dosado, bem dosado (sem falta, também, não sejamos hipócritas), com ambição dosada. Assisti a dois shows maravilhosos nestes dias paulistanos e que me remeteram a tantas lembranças... Um foi do Roger Hodgson (Supertramp) e outro da Rita Lee. O primeiro me emocionou mais, muito mais, vasculhou o mais profundo das minhas emoções e lembranças. A Rita, também, quando colocou no telão de alta definição do fundo do palco uma série de fotos antigas, medianamente antigas e mais atuais da vida e da carreira dela. Também quando cantou "Lança Perfume", música que ouvia em LP quase até furar. Do Supertramp, de vasculhar o passado e transbordar as emoções, "Fool's Overture", "The Logical Song", "Soapbox Opera", "Take The Long Way Home", "Dreamer", "Hide In Your Shell", "Give a Little Bit", "Easy Does It" e tantas outras, sem exceção de nenhuma. Divagação interrompida: olha lá a loira abrindo a porta da pick-up pra mais um curioso. Explica, responde, sorri, depois se mantém circulando. Quantas histórias e psiques espalhadas a se entrelaçar e a não se entrelaçar, mas ali dividindo o mesmo espaço! A voz sexy do auto-falante se faz ouvir de novo. Um senhor passa apressado e pega a escada rolante, mas não espera que ela a leve; sobe freneticamente os degraus atropelando quem está à sua frente. Acho que estava correndo atrás da voz sexy, que fizera a última chamada para o embarque de um vôo e citava alguns nomes. É fabulosa esta observação! Muito se mostra sem querer, muito se esconde propositalmente. Logo ali alguns escolhem ou simplesmente olham livros na livraria e revistaria, enquanto eu escrevo aqui e observo para ajudar a passar o tempo. A maioria está tão apressada que nem pensa racionalmente, vão por instinto e por memória repetitiva. Na minha frente continuam a loira e o carro, belos ambos. Mas que pessoas são estas? Que pessoa sou eu? Que mundo! É belo e caótico, reflexo da vida, reflexo de nós. Hora de pegar o vôo e passear pelas nuvens.
PS:
Escrito em 17/05/2010 no saguão de Congonhas, São Paulo/SP, por volta das 13h em meio ao vai e vem de pessoas e ao término de minhas mini-férias.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Da invisibilidade

Por que você me olha e não me vê?... Por que tantos me olham e não me vêem?... Por que tantos se entreolham se buscando e nunca se encontram nem se vêem?... Por que tantos se escondem e tantos são incapazes de enxergar aqueles que pulam diante deles?... Às vezes nem a nós nos vemos por completo... Às vezes? Não, é nunca!... Por que você não se olha e não me vê?... Nem você se vê? Cega!

Capacidade sublime

Na capacidade sublime de amar do ser humano está, dentre outras tantas capacidades, a de poder amar mais de uma pessoa ao mesmo tempo, de formas diferentes, pois o amor preenche espaços, mas o espaço para o amor é multidirecional e sempre pode se expandir indefinidamente. Nós damos o tom e o limite. Independe até de se usar Rexona ou não.
Obs.:
Aforismo surgido ao ler "o amor é cronológico" do blog "Pensa que cada dia pode ser o último", de Pedro Paulo.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Saber-se

Quem não se sabe ao menos um pouco prepotente e guloso, não se sabe nada. É como se não existisse, mas tão só figurasse em meio ao grande teatro da vida. Só atua, só se faz personagem, ator, não se descobre gente.
Obs.:
Inspiração nascida ao ler e comentar a postagem de Lara Amaral, "Ao mar", no seu blog http://laramaral-teatrodavida.blogspot.com/.

Um diálogo

- O seu psiquiatra é bom?
- É ótimo. Uma coisa de louco!
- Vou lá... E seu analista?
- Ah, só Freud explica. Me acha um neurótico, vê se pode!

terça-feira, 11 de maio de 2010

Continência

Entretanto, entre tantos, faço-me como posso
Contenho as piores ofensas à vida, acreditem
Pela gratidão que também guardo, sim
Dela, dos fatos, do bom, do que veio e do que foi
O grito eu calo em som, silencio
Mas ele se mostra nos olhos
Insisto, ainda assim, em sorrir muito
Afinal, riso e choro são duas faces da emoção

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Armistício

Estou tentando negociar um armistício comigo mesmo, mas as bombas continuam a riscar os céus... Elas vêm em forma de pensamentos!

Grades

As grades foram postas
Grades foram impostas
Lá foram postos
Lá ficaram
Em pensamento restrito

Um dia abriram os portões
Das grades postas
Das grades impostas
Depois de longa negociação

Mas lá ficaram
Lá postos, mas depostos de ser
Não sabiam mais viver em liberdade

(Uma vez nas grades mentais
A vida foge)

sábado, 8 de maio de 2010

Silêncio

E agora que teu beijo encontrou minha boca
E agora que minhas mãos encontraram teus seios
Silêncio

Só o som arfante das respirações compartilhadas
A conversa agora se faz tátil visual ofegante corporal
Silêncio

Não há palavras para descrever o momento
Não há tradução possível para esta linguagem
Silêncio

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Pedaços

Na eterna busca do "conheça-te a ti mesmo", será que algum dia a gente poderá dizer, plenamente seguro da totalidade da frase, "Eu me conheço"? Duvido! A gente conhece pedacinhos, fragmentos e às vezes descobre próprios pedaços que nem imaginava ter/ser/buscar/fugir/fingir, seja o que for.

terça-feira, 4 de maio de 2010

A ti

Suave e selvagem a lembrança
Inclino-me a ceder, girar
Lamento a partida
Ventos trazem-me teu perfume
Inclino-me, agora resignado
A ter-te no vazio

Sempre em minha mente és
Imagem constante
Lamento e fim
Vejo-te no escuro do meu eu
Inclino-me, triste e oco
Apalpo o colchão só

domingo, 2 de maio de 2010

Pre... pro... posições

Como é difícil quando o que era para ser ocasinal, raro, a acontecer uma vez ou outra torna-se corriqueiro, frequente, comum e até vulgar. Ao invés de acontecer "uma vez ou outra" passa a ocorrer "vez por outra", caso este em que o artigo e a preposição fazem toda a diferença. Cuidado com as preposições para que não se dê origem a proposições equivocadas e artigos de péssima qualidade.

Dentes à mostra

No fim do dia
tentei um sorriso forçado
que parecesse espontâneo
nem amarelo saiu,
nem sorriso o foi.
Foram só dentes à mostra:
era um rosnado.

sábado, 1 de maio de 2010

Cidadão (cidade grande)

Um dia saiu de barriga cheia
E chorou na chegada à vida
Era promessa

Neste dia saiu de barriga vazia
E desabou da solidão à fome
Era oco, nada

Entrou pela porta lateral
Construção abandonada
Sem posse

Foi para um canto qualquer
Frio e pelado... desfeito
Sem (en)canto

Amargura, azedume...

Jiló
Guariroba
Jurubeba
Amargo da vida
Da amarga vida

Limão
Então azedou
Azedume da vida
Azeda amargura
Mas amar-cura:

É vida!


Foto:
http://www.imotion.com.br/imagens/data/media/75/10243limao.jpg

Olhos em trânsito

De olhos fechados
Concentro-me
E em tua boca
Beijo a boca d'outra

Amor passado
Mal passado

Deleite e ilusão

De olhos fechados
Tateio teu corpo
E não encontro
A outra... Detalhes

Então abro os olhos
E lanço meu amor
A ti, o novo
Me arregalo todo

Estalo em tê-la
Estatalo!
Obs.:
Foto do show do Queen + Paul Rodgers, da The Cosmos Rocks Tour 2008. Tirada por mim no Via Funchal, em São Paulo/SP, em 26/11/2008.