quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

O poço

Era bem cedo quando recebeu as instruções, não se lembrava exatamente em que termos, se diretos ou indiretos ou de quem exatamente. A meta dada era cavar um poço profundo e seguir cavando. Pegou enxada, alavancas, pás, baldes, montou um sarilho, demarcou a boca do poço com diâmetro de aproximadamente dois metros e iniciou o trabalho. Era bem cedo, era bem novo. Não sabia muito bem como manusear as ferramentas, mas a instrução fora dada. Não imaginava que o trabalho seria tão árduo e menos ainda quanto tempo levaria, a que profundidade deveria chegar. Ordens são ordens. Pobre imbecil aquele. Organizou-se de forma a ele mesmo, num sistema de roldanas, jogar a terra para fora sem necessitar de ajuda. Ele mesmo cavava, escolhia as melhores ferramentas conforme a camada do solo em que estivesse e colocava a terra num balde que era içado lá mesmo de baixo ao topo, caminhava por roldanas, virava e deitava a terra ao redor do buraco e voltava engenhosamente lá para o fundo. Ao longo do tempo de trabalho se deparou com camadas diversas de terra: mais macias, argilosas, arenosas, siltes, rochosas, mistas e de diversas resistências. Não demorou muito para que chegasse no lençol freático. Seria preciso providenciar uma bomba de sucção, e assim o fez. A bomba trifásica ficava constantemente ligada de modo a escoar a água para fora. Quando faltava luz era um caos. A lama que já lhe impregnava não só o corpo, mas também a alma, lhe entrava por todos os poros, pelos olhos, boca, nariz, ouvidos, mas tinha que esperar e retomar o trabalho. Enquanto faltava luz, tirava a lama e a água com o balde, numa luta sem fim. Ainda não sabia qual seria a remuneração a ser recebida por aquele trabalho, mas imaginava ser algo muito bom, já que foi incumbência única: “É sua a incumbência a partir de agora, abra o poço, cave, ninguém mais deve fazê-lo, abra-o por si”, e assim vinha fazendo em sua longa jornada de poceiro. Ia cavando ininterruptamente, mal e porcamente descansava. Lavar-se, só com a água da chuva, mas a partir de certa profundidade tornou-se praticamente impossível voltar à boca. Dormia lá no fundo úmido e escuro, frio, às vezes, e solitário, mas levava a meta como uma missão, um oráculo, predestinação, tarefa irrecusável sob severas penas, pensava ou intuía. Já não sabia a que profundidade estava, a bomba de sucção de água havia sido substituída por uma mais potente e ainda assim chafurdava na lama para tentar manter uma mínima ordem dentro daquele imenso buraco. A luz do dia mal chegava lá. Alguém lá de cima lhe fez descer uma gambiarra com uma lambada incandescente de 60 watts na ponta. Era a única luz que havia. Quem lhe provia de bombas e luzes e alimentação lá de cima? Não sabia, mas suspeitava que a mesma pessoa que lhe ordenara abrir o poço e cavar e cavar e cavar ininterruptamente. As noites de sono eram curtas e nem sempre eram à noite. De tão profundo estava, já mal distinguia dia e noite, era tudo meio breu, muita lama, comida ruim, o barulho constante da bomba de sucção e o dividir o dia a dia com suas ferramentas de trabalho. Passou-se um período de tempo muito longo que, estranhamente, ele nem percebeu. Aquele poço era um feito fantástico, tamanha a profundidade e perfeição no diâmetro, no prumo, mas o que mais o admirava era a profundidade. Com a lâmpada ligada, já não distinguia, nem com esforço, o dia da noite. A comida chegava de corda, pelo sarilho, dentro de sacos plásticos, como se fosse lavagem, mas era comida fresca. Com a fome que tinha lhe parecia um manjar dos deuses. A água ia da mesma forma, mas em garrafões plásticos. Comia bem, não podia reclamar. Havia perdido a noção de tempo, havia perdido a noção de si, mas ainda assim achava que aquele poço, que aquela tarefa, era algo tremendamente ilustre. Um “poço sem fim”, pensava ele, orgulhoso do feito que ia fazendo. Os anos escavando lhe deram uma maestria enorme, inigualável. Progredia vários metros ao dia. Certa vez, junto com a comida e a água, chegou-lhe um bilhete enlameado pela descida onde se lia “Vai muito bem”. Abriu um largo sorriso e se encheu de entusiasmo para seguir escavando aquele “poço sem fim”. Ninguém havia dito que era um poço sem fim e bem sabia ele que aquilo não tinha cabimento. Haveria de chegar um momento em que as rochas seriam intransponíveis, mas havia nele um enorme prazer em intitular seu trabalho de “poço sem fim” ou até “poço sem fundo”. Quanto mais profundo, mais árduo o trabalho, o calor era insuportável, sua pele era já um couro ressecado e duro. Passou a usar picaretas e martelos e ia mais e mais sendo difícil aprofundar, mas ele conseguia, ainda assim, ir mais adiante. Os suprimentos de comida, água e lâmpada, da gambiarra que vez por outra queimava, continuavam com regularidade. Diálogo com quem estava lá em cima não havia, mas quando lhe parecia que ia se render, tamanho o sacrifício, tão grande o cansaço, tamanhas as dores e feridas e os questionamentos de “Por que um poço assim? Por que uma vida dedicada a isto?”, chegava-lhe um bilhete dizendo “Está fazendo uma obra prima. Parabéns” ou em outros “Ninguém além de você poderia fazer tão magnífico poço”. Retomado de energia e entusiasmo, escavava mais e mais e mais. Já não era exagero o nome que dera de “poço sem fim” ou “sem fundo”. Havia anos que estava ali sem conhecer a luz do dia, sem conhecer ninguém, sem qualquer contato que não aquele artificial de receber comida, água e bilhetes impessoais que o bajulavam. Cansou-se. Certo dia largou as ferramentas, colocou-as no balde e mandou-as para cima numa clara demonstração de cansaço, numa mensagem implícita que dizia “Estou farto, não vou mais continuar”. Gritou muito e parece que lhe ouviram. Puxaram a bomba de sucção pela corda e um facho de luz foi aceso lá do alto. Via uma cabeça de alguém, pelo menos era o que lhe parecia, a organizar as coisas. Não dava pra afirmar muita coisa, tamanha a profundidade, mas era a impressão ou a intuição. Talvez até, depois de tanto tempo, um pouco de alucinação, como quem vê miragens no deserto, e ali era mesmo um deserto sem vida. Ligaram um potente holofote mirando e iluminando o fundo do poço. A luz lhe cegou os olhos e um bilhete foi descido mais uma vez dizendo “Parabéns. Belo trabalho. Aguarde”, e ele aguardou. A luz continuava a iluminar. Na verdade aquela luz, de um holofote comandado por alguém lá de cima, era pra que a pessoa que ordenara e coordenara tudo o visse até a conclusão da meta. E qual era? Perguntava-se todo enlameado lá de baixo. Desceu outro bilhete dizendo “Fique num canto, vou descer um cabo”. Obedeceu, como sempre fizera. Passadas algumas horas chegou lá no fundo um cabo e ele compreendeu que era um cabo para içá-lo. Abriu um sorriso enorme e ainda leu o último bilhete que dizia “Agarre-se ao cabo” e assim o fez. Quando se deu conta sofreu uma descarga elétrica de mais de 5.000 Volts e foi arremessado violentamente contra a parede do poço semi-inconsciente. Com a ausência da bomba se sucção a água do lençol freático ia subindo não muito rapidamente devido ao baixo coeficiente de percolação do solo. Naquele estado, o corpo todo retesado, se questionou o que haveria acontecido. A luz do holofote se apagou, ficou na mais completa escuridão e retomou os sentidos no exato momento em que ouviu máquinas retroescavadeiras lá no alto movimentando toda a terra extraída por anos. Olhou uma última vez para cima, para um distante e apagado ponto de quase luz e sentiu um enorme peso de terra caindo sobre si. O poço foi totalmente coberto com a mesma terra, o poceiro fora soterrado vivo, mas perdeu rapidamente a consciência e também a vida. Era então bem tarde, era bem velho. No lugar onde fora aberto o poço fez-se, sabe-se lá quem, uma obra, como que uma lápide rústica de tijolos e concreto com os dizeres de um epitáfio: “Escavou um poço sem fim para fim nenhum, a não ser enterrar-se”.

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Consuma(i)ção

A vida não é, definitivamente, um fato consumado, mas é, salvo raríssimas exceções, um fato consumista. Ao final de todas as contas, é um fato consumido.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Recaminho

Fotografia: Ivan Bueno
Sinto a pressão que se acomoda sobre mim
A tortura de momentos e estradas erradas
Posso ter seguido por bifurcações estranhas
Posso ter caído, mas me reergui, retomei
Olhei adiante, me guiei pelas estrelas, pelo sol
E pelo solo iniciei meu necessário recaminho 

Ainda que sozinho, ainda que no escuro
Soube admirar a lua nova, invisível e gentil
Dando espaço à visão de tanto céu a mais
Caminhando fui, estou, vou recaminhando, indo
Onde chegarei é incógnita, onde cairei é sentença
Não é necessário ter certezas, mas tolerá-las

Nesse recaminho vou, nesse recaminho me faço
Nessa estrada incerta e tortuosa me vejo
Busco, encontro, perco e reencontro de tudo
Um pouco de tudo, um pouco de nada: mundo, mundo
Um certo recaminho incerto tentando cobrir a solidão
Um recaminho pra cobrir a interrogação

Recaminho na interrogação jogando areia
Recaminho nas curvas, pulo sobre o ponto
Mas tudo é tão incerto que decidi não ter certezas
Estou certo disso e da imprecisão que se precisa
Estou incerto da certeza desse recaminho, recomeço
Recaminho, redestino, remar remar remar...

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Chuva

Estou assim:
A cada beijo que vejo
Desvio o olhar
Meus olhos se enchem
Me engasgo
E escorro por mim mesmo
Buscando um beijo
Seu e meu
Sem te saber quem
Sem me saber como
Querendo um quando
Desde que já

Terra

Minha espiritualidade se enroscou em minha pele, tomou um banho de Terra e se tornou agnóstica. Agora questiono tudo, duvido de tudo.

sábado, 3 de dezembro de 2011

Viuvez

Matar mortos que precisam se tornar mortos morridos é algo fundamental na vida. Há tantos mortos vivos que nos perseguem por anos a fio e às vezes eles nem sabem!

Preciso de covas...

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Sei-não-sei

Foto: Cláudia S. Mendonça / Seattle USA
Eu já sei
O que não sei
Intuí, lacrimejei
A mim menti
Já hesitei
Atropelei
Agora fico perplexo
Diante do que sei
E do que desconheço
Eu-agora-antes-depois-sempre

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Labirinto




 

Decidiu-se por construir um labirinto, o fez com empenho e dedicação, muros fortes e intransponíveis, caminhos e descaminhos, como um labirinto deve ter, mas com muitos descaminhos mais, e escuros e úmidos. Concluiu a obra com êxito tal que se encontra no meio dele, sem encontrar saída.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

11.11.11






E hoje que o mundo celebra a abertura de um novo "portal místico", passo.






Desenho:
Tonho (Antônio Oliveira - Porto Alegre, RS) do blog 6vQcoisa e Pô-Ética.

domingo, 6 de novembro de 2011

Pausa

Foto: Piano Surdo - Tatiana Blass
O pianista tocava a sonata
Como se estivesse ao luar
Só ouvia a si mesmo
Mergulhado em partituras
Tornou-se ébano e marfim
A lua cheia minguou
A bela sonata acabou
O pianista, de pé, mirou o nada
Estava sem rumo, sem luz
Já não se sentia mais música
E o silêncio pairou



          Às vezes é preciso pausa... às vezes a pausa se impõe por si mesma.

Vira-latas

Fotografia: Ivan Bueno


Há quem crie cães, há quem crie pedigrees... Há quem cultive relações humanas, há quem valorize posição, status, influência, sobrenomes, raças... Há quem seja gente, há quem apenas pense ser.

sábado, 29 de outubro de 2011

Sentido

Costumam me perguntar se sou de direita ou de esquerda... Oras! Fazemos análise exatamente pra tentar saber se temos algum sentido.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Difícil agora

É difícil segurar o grito da tormenta
É difícil estar no olho do furacão
Sentir-se de mãos atadas, tripas furadas
Ver-se meio tudo-fragmento, meio nada

É difícil ver-se indo embora sem ir a lugar algum
Sentir o arroio que não mata a sede
Que não deixa navegar, que encalha, não flui
É difícil caminhar num escuro que não intui

          Agora o passo quer acelerar
          Agora as pernas não respondem
          Agora já nem é agora
          Agora já foi, já não é, já era

domingo, 2 de outubro de 2011

Lançamento do livro Empirismo Vernacular

Convido a todos para o lançamento do livro EMPIRISMO VERNACULAR que nasceu a convite de Marley Costa Leite, da Secretaria Municipal de Cultura de Goiânia/GO.
O lançamento se dará em 05 de outubro de 2011 no Deck Parking 01 - Sul, no Flamboyant Shopping Center, em Goiânia/GO.
Promoção da Secretaria de Cultura em parceria com a PUC-GO (Pontifícia Universidade Católica de Goiás) e da Editora Kelps.
















A coleção é composta de 183 títulos de diferentes autores, dentre eles o presente livro aqui anunciado, podendo todos serem adquiridos separadamente.












quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Inquietude

Estou inquieto... tão inquieto e agitado que me vejo quieto, imóvel, inerte, esperando que a inquietude passe ou mude de forma.

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Dia mais bonito

Hoje o dia é mais bonito
Hoje recolhi meu grito
Comecei o rito de falar
Comecei o rito de andar

Hoje o dia é mais bonito
Hoje teu olhar eu fito
Comecei de fato a te falar
Comecei de fato a te tocar

Hoje o dia é mais um rito
Onde é seu olhar meu grito
Começando de fato a conversar
Começando de fato a farfalhar

Hoje o dia é mais bonito
Porque hoje és a mais bonita
Porque hoje te fito o corpo
Porque hoje é de gozo o grito

terça-feira, 13 de setembro de 2011

A história perfeita

Era uma vez o melhor contador de histórias do mundo... e ele viveu feliz para sempre.
FIM
É claro que ele encontrou sua princesa, teve saúde, paz, prosperidade, muitos amigos e morava num lugar perfeito, afinal é a história perfeita.

sábado, 10 de setembro de 2011

Manchas do tempo

E a junção dos fatos não corresponde às fotos
Manchas do tempo
Traças a corroer as revelações
Marcas do vento
Troços a corromper as reuniões
Onde houvera amor

Laços fraternos a se desfazer em ódio puro
Cheio de afeto
Afetado pelo rancor e pelo desprazer
Cheio do infecto
Do normal pútrido que toma o bom
Mostra-o podre também

Nós e maçarocas, emaranhados de fios tênues
Alguns a se arrebentar
Nós em meio aos nós, gritando
Dores da falência
Órgãos múltiplos dando sinais de fraqueza
Órgãos como de igreja

E as junções dos fatos não servem à foto
Amarelou-se o tempo
Desnudou-se o templo com o sujo
Escureceram a luz
Apagaram-se as chamas de quem chama
E então me fui cabisbaixo, só

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

O dia

O dia não me promete nada,
nada espero do dia.
De dia à noite, um nada espesso
promete fluir, vazio e denso

Até se encher de
        não sei quê,
        não sei onde,
        não sei como.

Até eu me encher...

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Vórtice

E do vórtice ao vértice num segundo
Caminhar descalço, pé imundo
Andar é andar, direção é o que importa
Vai definir onde bater à porta

Tempestades, passageiras são
Passageiro de tempestades, sou
Ir de baixo acima é mera questão
De querer definir onde vou

Redemoinhos, ciclones, tornados
Tome cada um seus cavalos alados
Galopar rumo ao desconhecido
Busca de preencher o caminho corrido

terça-feira, 30 de agosto de 2011

De cisão

Tudo é sim ou não depois que passa pelo crivo do talvez.

domingo, 28 de agosto de 2011

Do secreto

Nossos segredos mais picantes guardei tão pra mim que nem você mesma ficou deles sabendo, afundaram na mesmice do não ser nem viver.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Breu

Os fogos se apagam
As luzes se reduzem às estrelas
Belas, mas insuficientes

Não se cozinha com elas
Não se vê o chão se não houver lua
E o fogo míngua
As brasas dão sinais de finitude

Voos só em baixa altitude
Voos só em baixa
Ou sem voos, parco caminhar

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Da efemeridade

Sou efemeridade. Se hoje estou vivo, "pasto". Amanhã, como inevitável é, morro e passo. O que é deixa de ser ou se transforma... a saber.

domingo, 21 de agosto de 2011

Crepitação

Pétalas caem
Folhas secas espalhadas pelo chão
Tapete crepitante sob os pés
Fim e recomeço
Ares de outono
Nenhum inverno a vista
Caminhada errante
Céu fechado
Núvens não tão carregadas
Flores desfeitas
Secura que precede chuva

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Da quantidade

Às vezes a gente se sente tão pouco, e este sentimento é tanto, tanto, tanto!

Da imagem




Se a imagem vale mais que mil palavras
Fotografo o poema
Desenho a crônica
Multiplico os significados

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Vão

Ela precisa parecer sexy nas fotos
Ela precisa parecer sexy
Ela precisa parecer
Ela precisa (a)parecer
Ela precisa
Ela... imprecisa

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Fr agm e nt o s

Fragmentos do silêncio,
Resto.
Rés ao chão, prostrado
De saudade
De inércia
De ausência

Fragmentos da solidão,
Resto.
Lixo espalhado a reciclar
Em agregar
Em ajuntamento
Em som, amor

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Horizonte

E do oco, grito rouco, pairou um nada.
Ondas imensas, nadei contra a maré:
Caldo, jacaré, tombo, areia na boca em vida;
Tipo estranho de lida.

E no vazio reinante, eu mutante.
Metas rôtas, metamorfoses tantas:
Vírgulas, dois pontos, reticências, ponto não;
Tipo estranho de exclamação!

E no horizonte, sol se põe a oeste,
E do lado leste, promessa de um amanhã que reste.
Pra lá fico olhando em teste
Esperando o sol reaparecer, preencher...

terça-feira, 19 de julho de 2011

Sofisma

Numa vida feita de sofismas, pobre criatura, sempre teve dificuldade de encontrar suas próprias verdades.

sábado, 16 de julho de 2011

Buraco negro

Há gente que quanto mais se enche de palavras, quanto mais fala, quanto mais conteúdo quer ostentar, mais vazia se mostra.

Coração

Acalma-te, mas bate.
A sofreguidão é tua essência,
Acalma-te dentro do possível,
Mas bate, bate bem,
Lembra-me, suave, do meu bem
Distante, errante, mutante...
Bate com passo firme,
Compasso segue fazendo possível
Viver, sentir, amar, andar
Ah, maltratado coração.

terça-feira, 12 de julho de 2011

Do que cheira mal

Há quem consiga ver o podre, cheirar o podre e não se incomodar. Normalmente estes mergulham no podre e podres se tornam, disseminando sua futilidade sem nem sequer notar que são, por si só, uma necrose.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

C(o)umprimento

Para que a vida se cumpra será preciso que ela seja comprida? Pairam dúvidas ao redor das cabeças que nisso pensam!

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Busca

Pausa, pousa a mão em minha vida
Deita, sê parte de mim, dos meus
Vem, faz-me encontrar meu próprio eu
Vai, eu te busco onde quer que for

Enxurrada que arrasta vidas
Vidas que resgatam outras
Gentes perdidas
Eu quem? Eu onde? Eu por que?

Pensa, senta aqui assim tão bela
Pousa, pássaro belo que és sem asas
Cala, fala em beijos e mãos
Sinais, amarelo, verde, seguir

Tempestade que impede saída
Saída que pede bom tempo
Eu perdido em ti
Eu buscando a ti, em ti, por mim

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Cálculo







Não conto com ninguém
Por isso então
Uso calculadora

domingo, 8 de maio de 2011

Negativo

Ela estava olhando os negativos das fotos,
E isto não podia ser positivo.
Havia inversão das luzes,
Deformação das formas,
Uma séria (des)ilusão.

Ela via a luz convertida em escuridão
Enquanto o breu se convertia em luz.
Um certo contrário, um inverso,
Um prejuízo do lucro do universo;
Um ilusionismo perigoso, se desconhecido.

Estava assolada, sem ver figura real,
Sem saber onde estava a verdade e o surreal.
Pode-se ter tudo distorcido num átimo
E o negativo assim visto
Não é mesmo positivo.

Era preciso preservar as figuras
E ela havia se perdido de vez vendo os negativos.
Perdeu a própria autoimagem,
Perdeu e fez que perdessem
Até mais... viva ilusão.

terça-feira, 26 de abril de 2011

Que pena






No desespero da necessidade e da fome, matou a galinha subitamente e a comeu, ainda que com pena.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Da omissão





As pessoas se omitem muito diante das coisas mais fúteis, frívolas e absurdas... mas não quero me comprometer afirmando isto.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Mal passado





Ando passando mal
Por isso as roupas tão amarrotadas
O rosto franzido

sábado, 2 de abril de 2011

Esquecimento

Este mundo, que está passando pelo dito aquecimento global, é um mundo bem "fresco"... Alguém se lembra?

quarta-feira, 30 de março de 2011

Impostura





Era uma criatura divina
Sempre foi uma grande promessa
E que jamais se cumpriu

quinta-feira, 24 de março de 2011

Da geração

E então, onde está
a mão que me apoiava,
o olhar que me sustinha,
a voz que me acalmava?

Onde estou eu
sem tudo isso?

Quem sou eu
quando intento tento
me descobrir
naqueles que me geraram?

Quem deixo de ser
quando tento
me (re)inventar
e quem de verdade me torno?

domingo, 20 de março de 2011

Desfaçatez

Não espero mais que o calo se desfaça
Disfarço os pés, deixando-os limpos
Olho para o mundo imundo e me calo

Não creio mais que a farsa de desfaça
Em meio a tanta desfaçatez
Resta-me engolir a angústia de existir

Não tenho mais esperanças em ter fé
Deus se mantém calado no todo
Ou fala grego, onde outros deuses reinam

Palidez




Comecei a morrer
Faz tempo
Agora vivo assim
Pálido

quinta-feira, 17 de março de 2011

Mergulho (por Aline Morais)

Silêncio!!!
imploro imóvel enquanto assisto o tempo empurrar as horas ladeira abaixo!
Silêncio!!!
suplico atônita enquanto abafo os ouvidos de medo!
Silêncio!!!
ordeno desesperada ao que resta de nós...
ao pedaço que amo
ao pedaço seu que me interrompe com o mesmo sorriso!
Silêncio!!!
mordo a boca, quando a voz me escapa em melodia, tema de alegria, nossa musica!
Silêncio!!!
petrifico enquanto escovo meus cabelos prateados que de ousados escapam meu brilho!
Silêncio!!!
o som do mundo me afronta e aponta minha dor
mergulho em notas vazias
som oco
me calo aguda!
não há pausa que acuda!
lembranças frias!

Obs.:
Poema de Aline Morais, do blog Periódico Subversivo feito em homenagem a uma pessoa que amo muito.

quarta-feira, 16 de março de 2011

Rosto




Rosto de olhar sedutor
Que faço eu, seu doutor
Meu coração bate forte






Obs.:
Continuando a sequência de provocações poéticas feita por Ianê Melo.

terça-feira, 15 de março de 2011

Tato




Dias de chuva
Mãos sem luva
Tato sem fim






Xilogravura: Osvaldo Goeldi
Haicai feito a partir de uma "provocação" de Ianê Melo, dos blogs abaixo, no Facebook:

segunda-feira, 14 de março de 2011

Voo

E valeu a pena, disse o pássaro depenado e altruísta.

domingo, 13 de março de 2011

Viagem de si

Um dia saiu para viajar
Queria conhecer o mundo
Queria ver tudo, saber de tudo
Sentir e experimentar

Longa foi a jornada
Demorado foi o tempo
E ao retornar a si, descobriu
Não tinha se conhecido, nada

Então questionou a todos
Por onde andava ele mesmo
E viveu a perguntar aos outros
A deus e a todo mundo

quinta-feira, 10 de março de 2011

Ledo engano




Acham-me espirituoso...
Que nada!
Ledo engano.
Sou agnóstico puro!

quarta-feira, 9 de março de 2011

Vai Vai, maestro

Vai vai, já incentivavam
Mas ele já havia ido, e longe
E vai vai mais longe ainda
Pois agora lhe basta um sorriso
Ou um choro, um engasgo
Para que leve emoção ao povo
O que fazia com seu caminhão
Agora faz com seu caminhar
A regência da vida
Salve, maestro!



Obs.:
Homenagem a João Carlos Martins, um dos grandes nomes da música no mundo, agora mais uma vez vitorioso com a escola de samba Vai Vai, de São Paulo. Parabéns, maestro.

quarta-feira, 2 de março de 2011

Solidão

A solidão às vezes é boa companhia
Às vezes é apenas solidão
De vez em quando é tortura
Vertigem, desencanto, tontura

A solidão às vezes é plena
Às vezes é vazia, oca, nada
De vez em quando é encontro
Regalo, reflexo, folha seca no tronco

A solidão às vezes é só
O que só lhe dão
Nada mais, nada além, vida aquém
Sem um grama a mais, um nem

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Cinemateca

Então eu criei filmes mudos
Com diálogos estranhos


          [E tudo se passou
           na (des)continuidade]

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Salvação

A salvação não veio
Mandaram mensageiros de todos os cantos do mundo
Luzes de diversas matizes
Energias mil
Rezas e orações profundas
Mas nenhuma salvação chegou
Mãos na testa, gritos
Orações introspectivas
Projeção de energia pelas mãos
Mas nenhuma salvação veio
É a eterna promessa que não se cumpre
Mas enche bolsos

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Nado sincrozinado

A superficialidade extrema me choca profundamente. Já o excesso de profundidade e densidade me fazem querer ir à superfície tomar ar, respirar para sobreviver. Viver tem que ser como um nado, senão nada.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Beija a flor

Ainda, algum dia,
Vou conseguir
Fotografar um beija-flor.

Ainda, algum dia,
Vou conseguir
Beijar uma flor.


          ... É tudo tão rápido
              Tão efêmero
              Tão beija-flor...

Fio

Tudo na vida tem um lado positivo, dizem por aí, mas às vezes é o positivo de um fio desencapado. Dá choque, até mata!

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

(Des) crenças

Em meio aos mais profundos mergulhos nas minhas (des)crenças, às vezes penso que a forma mais pacífica de eternidade seja a da inexistência.

Eu

Eu me disfarço tão bem de mim mesmo que normalmente as pessoas nem notam que nem eu sei bem quem sou, onde estou ou pra onde vou, enquanto sigo sendo eu e não eu.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Casulo

Deixe voar
As borboletas que tens
Dentro de ti
Deixe voar
Encontrar o néctar
Que lhes dá vida
Que lhes dá razão
De ser
De querer
De serem borboletas
Coloridas e livres
Lindas como tu

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Relativismo absoluto

A sensação da passagem do tempo é relativa, mas seus efeitos são absolutos!

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Suave espera

Em meio à suave espera, o ácido
Entre as aves esparsas, o árduo
Voos esperados, rotas feitas
Tons rastejados, notas feias

Ah... notas feias não há!
As aves, suaves, fazem harmonias
E, se harmônicas, belas.
Use quaisquer notas, só saiba juntá-las

Assim, um dizer nunca deve ser vulgar
Deve carregar o requinte do simples
Educação, boa emoção, sinceridade
Tato na abordagem do fato

E a suave esparsa espera segue
Enquanto espero seguindo
Enquanto, em repouso, caminho
Pois o pensamento vai adiante  s e m p r e


          São Paulo, SP
          29/11/2010 (12:53h)

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Remake

Somos uma inauguração
          do velho
De atos inéditos
          repetidos
De fatos novos
          todos tão antigos
Releitura
          de velhos artigos

Somos a refilmagem
          de clássicos
Medíocres filmes passados
          revistos
Com mais efeitos
          e pirotecnia, talvez
Temos mais cor,
          mas menos toque

Somos um remake,
          um retake
Com novas trilhas sonoras
          pobres
Com atuações
          às vezes pífias
E continuamos em cartaz
          com o mesmo the end


          São Paulo, SP
          28/11/2010 (19:14h)

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Triiiiiiiimmm

Já o despertador havia tocado freneticamente, já havia passado da hora, mas o corpo continuava inerte, deitado, sonolento, sem ação, embora houvesse, ao menos em parte, alguma consciência dos fartos fatos a se desenrolar no mundo exterior, aquele hipócrita. Ou não será ele o hipócrita?

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Da vida

Vida em embrião
A sequência é correr no quintal
Subir em árvores
Espiar nos buracos de fechadura
As amigas da própria irmã

Vida num trilho
Trilhar numa linha
Pensar que se tem destino
Mas nas paradas tantos descem
E o trem vai ficando outro

Vida em começo
Em passos trôpegos
Início embriagado
Caminho inebriado que se faz real
Realidade que tomba

Vida em fim
Sem correr, sem quintal
Árvores caídas
Acena o tempo com a incoerência
Tempo que se traveste em solidão

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Baba ovos

Tenho visto por aí muita gente que baba, mas há uns tantos que babam claras e gemas em abundância, e então lhes escorre tudo pelos cantos das bocas, como se ovos rachados e podres. Me choca! É o tipo de gente mais repugnante, perigoso e tóxico com que se pode lidar!

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

A ressurreição de Lázaro

- Olá.
- Olá.
- Tenho algumas verdades a te dizer.
- Pois diga.
- Na realidade são duas coisas, as demais são ramificações e consequências dedutíveis.
- Vá lá, diga.
- Teu verdadeiro nome é Lázaro.
- Já o suspeitava. E que?
- E não há nenhum cristo a vir te salvar.
- Já o sabia.
- Não trago novidades, então?
- Não, apenas confirmas aquilo de que suspeitava, quase sabia.
- Já o sabes agora, então.
- Sim.
- Nada mais, me vou pra as outras paradas. Vida de mensageiro de notícia única.
- Vá com deus.
- Olha lá esta ironia.
- Desculpe-me, não foi a intenção.
- Sempre é.
- Será?
- Sim, sempre.
- Discutível.
- Discuta só, pois me vou só. Adeus.
- A deus.

          Pintura:
           A Ressurreição de Lázaro - Van Gogh

Neste jeneiro, não Rio

Neste janeiro, não Rio, não dá.

A margem que margeia o rio não me dá margens ao erro e nem à vida. A margem, que antes se estreitara, agora se alarga e nos engole, desce morro abaixo, morro, morrem tantos.

Não há graça, foi tudo coberto por lama.

A vida, em grande parte, se exauriu. O que há a se exaltar agora é a solidariedade, já que os céus foram cruéis. Espíritos subiram ao alto e abaixo desceram alguns.

Cachorros e crianças vagam sem donos, sem pais... e sem paz.

A chuva não lavou alma alguma, ceifou vidas e lugares belos. Não há muito espaço para o sorriso.

Neste janeiro, não Rio, não dá.

A cicatriz na terra encantada foi feita e o desencanto foi posto à mostra.

Não Rio, só lamento. E o Cristo Redentor lá na capital, impassível, sem conceder redenção àquele povo que buscou um canto belo, um encanto belo.

O sorriso se foi. Voltará, mas não será jamais o mesmo.
Amarelou-se, enlameou-se, sacrificou-se, crucificou-se.


          Foto 01: Fábio Motta, AE - Teresópolis, RJ
          Foto 02: Wilton Júnior, AE - Teresópolis, RJ

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

O que há

Há em mim uma melancolia
     inata
E um fascínio enorme
     pela vida

Há uma dose de medo
     e insegurança
E uma audácia em fazer
     e ousar

Há uma página
     em branco
E uma caneta pronta
     a escrever o novo

Há um borrão e cicatrizes
     profundas
E uma delícia em sentir
     a redenção

Há assim, tudo junto
     e misturado
Dentro aqui de mim,
     bem profundo

Há mil fórmulas,
     mil cálculos
Difícil só é fechar
     esta equação