quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Hastear bandeiras

- Cadê a bandeira branca?
- A nossa já hasteamos, senhor.
- Disso sei, quero saber da bandeira branca deles. Não hastearam?
- Não, senhor.
- Mas nos disseram que iriam hasteá-la tão logo hasteássemos a nossa!
- É uma guerra.
- Mas há de se ter princípios até mesmo numa guerra.
- A falta de princípios é o principal princípio nas guerras, senhor.
- Tem razão, soldado.
- Obrigado, senhor.
- Não me chame de senhor, soldado. Estamos todos na mesma trincheira, sujeitos à mesma bomba, à mesma morte. De que servem títulos no mundo? Senhor, doutor, digníssimo, excelência? Isto só alimenta egos... Vamos todos apodrecer na trincheira, mesmo.
- Sim, senhor.
- Deixe a bandeira branca hasteada, a nossa, mas antes me chame de você.
- Sim, senhor: você.
- Mas aí ficou estranho!
- Desculpe, senhor.
- Ai, deus, vá logo e deixe nossa bandeira branca hasteada. Se as bombas vierem, minha consciência estará tranquila de não ter matado inocentes do outro lado. Cumpri minha parte, ao menos.
- Você tem razão.
- Agora sim... você! Gostei. Estamos na mesma trincheira.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Um plano

É parte do meu plano
Andar desnorteado
Rumo ao oriente ocidentalizado
Renegar o criado
Fazer tudo por mim
Seguir, como for, ao fim

É parte do meu plano
Confundir ao explicar
Explicar a confusão
E só então seguir pra não sei onde
Esquecendo-me de ti
E esquecido já de mim

É parte do meu plano
Encontrar um jeito
Rumar em direção ao imperfeito
Remediar e curar
O incurável fim
Deixar findar assim

domingo, 26 de setembro de 2010

Noite

          Registro tardio:
          Ao arrumar toneladas de papéis e pastas e certificados e sei lá mais quê, me deparei com alguns escritos antigos, alguns no verso de cartões de visita, alguns em guardanapos, outros em folhas em branco. Aqui os deixo registrados, ainda que alguns me pareçam de qualidade duvidosa. Este foi escrito em 20/01/2004 às 23:10h.

A noite é uma criança...
Não!
A noite é um adulto com insônia
Louco pra viver,
Se encontrar
E encontrar.
Viver o encontro
Sem o sono infantil,
Sem dormir cedo,
Sem pudor
E com prazer

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Dicotômico

A vida é finita, e isto nunca acaba. É a constância da inconstância, o eterno do efêmero.

A vasculhar

Não quero a idolatria da hipocrisia
Que me olha e não se vê
Nem mesmo meu espelho reflete
O que sou, o que desejo
O anseio, o desespero

Meus olhos imergem em mim mesmo
Afogam-se em minh'alma
Náufraga de sucessivos atos
Mar profundo e bravio
Emergir é necessário

Submarino ser, sem objetivo e meta
Se mete nas profundezas
Vasculha locais profundos demais
Encontra o desconhecido
Descobre-se temido

domingo, 19 de setembro de 2010

Sofistic... ação

De que serve qualquer sofisticação e requinte, se esta sofisticação e este requinte não partem da alma, do jeito de ser, de agir, do calor humano, da sensibilidade? Assim é tudo objeto... fica tudo abjeto.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Obrigação

Somos obrigados
A gostar do que não gostamos
A eleger os inelegíveis
A crer no que não cremos
A dizer amém
Com falsidade e hipocrisia

Somos obrigados
A nos obrigar ao voto
A nos abrigar do vento
A evitar o sol
Diminuir o sal
E "gostar" de quem desgostamos

Somos obrigados
A ler o que não queremos
A escrever do que não sabemos
A sobreviver ao crime
Sorrir chorando
E secar as lágrimas ao vento

Mas há escapatória
Nessa história que criamos
E vivemos
E corremos
Ao vento, aos prantos
Em meio, também, a encantos

Vítima

Hoje sua função é a de ir lá ao blog Vítima da Quinta e descobrir quem fui, digo, quem foi a vítima desta quinta-feira. Em cada quinta o Eduardo P. L. faz uma vítima. A ideia é de descobrir quem é o blogueiro vitimado da semana, mas sem revelar. Toda quinta, uma nova vítima. A próxima pode ser você. Cuidado!

Caricatura por:
Eduardo P. L.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Grito de exaustão

O ar espesso e denso e seco.
A caixa d'água, antes repleta,
agora por poucas gotas da exaustão.

O clima desértico
desertificando as almas,
as vidas secas já romanceadas.

As gotas que o céu se nega a verter,
vertem nas faces pálidas,
rostos trêmulos, olhares perdidos
e em busca... De que?

O horizonte distante
responde com seu silêncio
alaranjado e belo, e se despede
pra voltar com o mesmo silêncio
na manhã seguinte.

Se tudo é relativo,
como não poder considerar a Terra
o centro do universo?

Basta recalcular o movimento das órbitas
e reconsiderar que nós, ridículos seres,
ridiculamente criados, podemos ser
o centro de um gigantesco nada
cheio de falta de vida.

E, estando no centro,
sendo o universo infinito,
estaremos equidistantes
de qualquer das extremidades
existentes e impossíveis.

Centro louco!
Grito rouco
de exaustão prepotente.